dezembro 27, 2008

Sem ti

Sem ti o mundo é um sítio, só
Sem ti as palavras são espectros de sentidos
Sem ti as horas são a morte mais depressa
Sem ti os lugares são a geografia do nada
Sem ti o meu coração é só físico
Sem ti as minhas mãos ficam nuas e tremem
Sem ti os meus olhos são prisioneiros da memória
Sem ti os meus pés quebram, não há estrada
Sem ti o Amor é dos outros e eu sou letra morta
Sem ti os outros são a sombra da tua grandeza
Sem ti o mar é um absoluto perene, absurdo
Sem ti o sol é pensamento que dói
Sem ti a noite é o mais fundo da solidão
Sem ti as ruas são o labirinto da saudade
Sem ti os continentes são aquilo que fica por conhecer, contigo
Sem ti as fotografias capturam o nu que sou
Sm ti as cores do mundo são um insulto feroz
Sem ti há um medo que se cola às paredes do que sou
Sem ti sou uma ínfima parte de mim
Sem ti sou membro amputado, ferida exposta
Sem ti o vento é o eco da tua voz, ao longe
Sem ti as estrelas são só astros do desencanto
Sem ti a minha cama é uma tumba para dois
Sem ti a música é o requiem das palavras
Sem ti sou a criança vulnerável, no frio do Inverno
Sem ti a rotina é tédio, vezes sete
Sem ti o banco do jardim é madeira sórdida
Sem ti fico sem casa, nómada da desgraça
Sem ti as cidades são a improbabilidade de te encontrar
Sem ti as vozes que ouço são o sonho que já tive
Sem ti o pecado é obsceno e as emoções rios de sangue gelado
Sem ti respirar custa como se quisesse a dissolução
Sem ti o sentido das coisas fica enterrado no não-ser
Sem ti afogo-me na dor-lume que arde sozinha
Sem ti a minha anatomia é a de um animal abandonado
Sem ti a estética fica nos diários dos amantes
Sem ti os espelhos ampliam-me até à loucura
Sem ti as crianças são a minha metade à procura de mãe
Sem ti os meus dedos dedilham o teu cheiro na primavera de ontem
Sem ti faço amor com o desamor de mim
Sem ti os aeroportos são lugares de irremediável separação
Sem ti o cemitério é a morada certa onde me podes encontrar
Sem ti os olhares são sinais das trevas
Sem ti a minha boca sufoca na ternura por dar
Sem ti os poemas são a teoria de um mundo inacessível
Sem ti os semáforos dizem-me que os homens prosseguem apesar do vermelho do meu coração partido

Sem ti que a chuva chore comigo,
que a àgua me leve até ti,
que o destino me empurre até ti.

(só) Contigo, sou eu.

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