fevereiro 08, 2009

Nós em cada um


Tenho pensado em viajar contigo para um sítio longe do mundo, do nosso mundo. Queria pegar em ti e colar-te a uma paisagem nova e fresca onde as nossas vozes, as nossas almas pudessem gritar numa linguagem estrangeira à censura, onde o coração respirasse o amor sem manuais de etiqueta. Se aquilo que eu sinto é para ti que caminha, os rótulos são a infelicidade alheia a reconhecer-se no seu contrário. Imagino os nossos corpos longe da agitação e as palavras a escreverem a verdade numa parede da vida, aquela que a rotina dos distraídos preenche com "post-its" de coisas banais. Não é isso que quero para nós. Aliás, é o "ser" que nos ata um ao outro que me faz escrever. "A estrada ainda longa, há distâncias sem perdão."
Quando penso em quebrar os dias aqui e ir mais longe é em ti que pouso e é por ti que arrumo a minha vida de acordo com o amor que vai cá dentro. Chega de gavetas para as frases frágeis, de arquivadores para essa pureza que nos roubam pelo caminho. Sou em desordem, o momento sugere as palavras que saem enquanto respiro o cheiro da tua serenidade. Continuo a imaginar uma parcela do mundo só nossa - essa onde o lume da cumplicidade derretesse as reticências e exclamasse pelo conhecimento que deixasse a tua marca em mim. Nunca se esquece quem nos faz amar, quem descobre ruas mal iluminadas dentro de nós. Quero-te toda, quero saber-te completamente, quero o absoluto de ti a assobiar-me ao ouvido. "Não sei quanto tempo fomos, Nem sei se te trago em mim."
Sabes, nunca aceitei aquela ideia de que o peso do tempo é maior do que a densidade de um amor à luz da imperfeição. Saber tudo sobre ti não me rouba o arrepio quando a tua voz me chama e diz o meu N-O-M-E. Cá dentro é sempre a mesma explosão, há qualquer coisa que cresce mais e se entranha mais. Olho para ti, prendo-me à repetição dessa imagem e, de cada vez que reparo em cada pormenor, desaba tudo em mim. Por isso é que tenho de olhar de novo, soletro os teus sinais com a vontade a tombar para a frente de tão forte. É bom quando o silêncio serve para contemplarmos, quando a comunicação passa aqui por dentro e chega a ti. "Deixas em mim, tanto de ti." É o conforto do que nos é familiar ao mesmo tempo tornando-se numa aventura para sempre. Vício maior do que o cansaço, aquele que vai buscar a curiosidade ao outro lado da lentidão dos hábitos.
Percebi que por trás das palavras e por trás de cada movimento da tua boca há um começo todos os minutos, a magia acontece em cada coisa que já cá estava mas que repito pelo prazer de a saber minha. Viajo pela minha vida com o teu bilhete de identidade. Estamos entregues a um destino comum, a beleza vem desse retrato que construímos dentro de nós com muitas correcções, muitas notas e hesitações. Eu de ti e tu de mim. "E pararam o mundo, Num abraço sereno." Podemos descansar a dúvida e sentir-nos inteiros na entrega que o outro devolve com confiança. Gosto das marcas que a vida deixou aí dentro e quero tocá-las para te saber melhor, para compreender. Vejo a paisagem nascer desse trajecto ao mais fundo da tua história e o coração não afrouxa a paixão, ela ergue-se maior. "Gosto de ti como quem vence o espaço, Como quem salta o vazio."
Essa viagem acontece, percebi eu, mesmo estando nós nesse mundo de toda a gente, todos os dias, em tudo. Basta chamar-te até mim e sentir os teus braços dissolver em protecção os olhares de quem sempre fica fora de tudo. Contigo há uma frescura que desentorpece a linguagem dos afectos e é bom saber onde tocar, onde ir buscar(-me) (n)os pedaços que a rotina espalhou por aí. Vivo contigo, literalmente. Na palma da minha mão há duas linhas que se juntaram para abrirem, juntas, um mundo novo, uma linguagem interior que sabe ao conhecido. É bom ter um porto seguro, aquela luz numa noite de náufragos que a vida também sabe ser. "Sou mais uma página do teu caderno, Tantas vezes escrita no carinho do tempo."
Escreve-te em mim com o sangue do teu amor. É sempre a mesma explosão. Cá dentro.
*Pedro Abrunhosa, a negrito.

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