"Às vezes percorro a casa. É uma casa que se está bem sozinha. Sempre pensei. É quando tudo acabar e se calar. Com as coisas. E ela que sempre gostou tanto de coisas. São as que a castigam mais, as coisas. As de sorrir e as de recuar pelos golpes que relançam.
(...)
A vida dá muita volta. Não: dá apenas uma volta inteira, às vezes truncada. Pescada de rabo na boca, serpentina. Todas as coisas que lhe aconteceram, e eram poucas, eram repetições de remotas.
(...)
Ainda hoje tendo a pensar como Irene que a bruteza, com a sua carga de suspeição e inveja é toda a maldade que há, é a madre da maldade. (...) O que significa que também o abandono, ou o que é percebido como desamor, seja fonte do mal. Isto, que é banal, na tortuosidade do coração tenro não se sabe até se saber. E sabê-lo não é desconsegui-lo, nem desrepeti-lo de vez. Continuo a encolher-me de quem me escraviza e a ter raiva a quem me deixa só.
(...)
Orlando olha. Não o move o tédio, mas o princípio da indeterminação - não sabe para onde tem que ir e tem vergonha do princípio de indeterminação. On the road? Oh que não, Live fast die young? Inda menos."
In: Irene ou o Contrato Social, Maria Velho da Costa
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