dezembro 28, 2008

O fast-food do Amor

"Os lugares do amor são ferrugentos, abrem portas desusadas, perras nas dobradiças. O amor chia nas empenas, incomoda os vizinhos, a vida organizada do corpo e do coração. Ele sabia que o amor doía ao príncípio, tinha medo de quando deixasse de doer e ficasse igual a outra coisa qualquer. Por isso, disse-lhe logo à partida que não acreditava naquele amor que aparece já pronto, arco-íris inesperado no fim de uma curva qualquer. «O amor constrói-se», dizia ele, eficiente artista plástico. «O encantamento vem da construção.» Ela tinha vontade de lhe dizer que é precisamente ao contrário, dessa insónia iluminada a que se chama inspiração é que nasce a ideia, e depois a construção. Se a construção for feita devagar, como o amor, gemendo lentamente nos gonzos do encantamento, pode ser que a obra dure."
"Carta a uma Amiga", Inês Pedrosa